Em encontro com o líder da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, o presidente Lula foi econômico nas palavras e preciso na análise. Quanto mais tempo o governo de Israel persistir com as violações da lei humanitária internacional, mais distante fica a possibilidade de uma solução negociada para o conflito no Oriente Médio. Enquanto não for destruído o muro erguido na Cisjordânia para anexar ilegalmente terras, e não forem garantidos aos palestinos os direitos de propriedade, de ir e vir, e de buscar saúde, educação e emprego, qualquer enunciado sobre a paz será apenas uma ironia semântica. Um discurso que admite a realidade do que é virtual, mas que não pode ser colocado no plano lógico daquilo que já tenha adquirido existência concreta.
É necessário, mais uma vez, reconhecer que, respaldado pelo imperialismo norte-americano na região, a construção incessante de assentamentos em território ocupado obedece a uma lógica clara. O governo israelense joga todo o seu peso em uma solução definitiva para o “problema palestino”: uma solução que vem contemplando o massacre e o apartheid.
Como declarou, há cinco anos, a jornalista judia Amira Hass, "Israel se considera forte o bastante, até para desrespeitar decisões internacionais, porque tem um poderoso apoio dos americanos que, na prática, não demonstram o mínimo interesse quanto ao destino de um povo que vive isolado atrás de barricadas."
Apesar de ter participado de todas as negociações de paz nos últimos 30 anos, envolvendo-se em articulações secretas que levaram a acordos como o de Oslo, sabotado pela extrema-direita de Israel, o presidente Shimon Peres, tem um ponto em comum com as forças mais reacionárias de seu país: a não aceitação de qualquer saída que preserve um mínimo de organização do movimento palestino, que mantenha intactas as possibilidades de unificação com o vigoroso movimento anti-imperialista que ainda existe nas vielas de Gaza e da Cisjordânia. Peres sabe que desestruturação organizativa das forças de resistência resulta em tratativas diplomáticas destinadas a ganhar tempo. Uma manobra que se repete sem apresentar qualquer sinal de inteligência.
Apesar da mudança de tom de Obama, o governo estadunidense adota a abordagem preconizada por Israel. Trabalha com a possibilidade de uma reforma política que assegure a proteção das colônias e dos interesses sionistas na Palestina Ocupada. Para tanto, exclui atores legítimos como o Hamas, e as bases sociais que representa, estabelecendo, por conseqüência, um simulacro de negociação diplomática.
Em “A Paz ou Apartheid”, o escritor Marwan Bihara, assinala que "a melhora desesperadamente necessária das condições de vida dos palestinos se tornou impossível com o plano de bantustões de Sharon. Enquanto, continuarem taxando de terroristas todos os partidos políticos palestinos, a formação de um processo político democrático continuará sendo uma farsa. A maioria das lideranças foram assassinados ou presos. Muitos estão foragidos, escondendo-se para a sua própria segurança."
Lula foi preciso. ”Se continuar construindo na capital palestina, Israel está complicando a paz, quer que nos distanciemos da paz. Pedimos não apenas a retirada das 900 casas, mas de todas as atividades de construção nos territórios ocupados. Essas palavras não são nossas. Foram ditas pelo presidente Obama."
A única ressalva a ser feita na fala presidencial solicita um acréscimo. É preciso ir bem além das “palavras de Obama". É fundamental reafirmar nosso discurso. O que deve ser dito é que a coalizão de colonos, fundamentalistas e generais reacionários que domina o plano político israelense não tem o menor interesse em implementar acordos que possam prejudicar a expansão de assentamentos ilegais. Enquanto a comunidade internacional, liderada pelos Estados Unidos, não fizer a inflexão necessária, a muralha, que tem 80% de extensão em território cisjordaniano, continuará edificada como uma solução final da barbárie. A arquitetura perfeita da destruição.
Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil
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