terça-feira, 13 de setembro de 2011

Vale a pena mimar os ricos?

A maior ilusão da era atual é achar que a sociedade deve ser infinitamente grata aos ricos. Eles não devem nada à sociedade. A sociedade deve tudo a eles como “geradores de riqueza”, porque a sociedade em nada contribui para o seu sucesso. Os costumes e valores a contribuir para o resto da interação humana – reciprocidade, distribuição proporcional do sofrimento e da recompensa, responsabilidade e obrigação social – devem ser suspensas para eles. Se quisermos desfrutar dos benefícios de um capitalismo dinâmico devemos reconhecer que os ricos são diferentes – e não autodestrutivamente taxá-los. Os neoconservadores americanos e sua escolta republicana trabalharam incansavelmente por 50 anos para promover esse foco, que ofende não apenas os primeiros princípios da humanidade, mas aquilo que sabemos sobre o capitalismo.
Um capitalismo bem sucedido é um fenômeno extremamente difícil de criar e manter. Depende sim do espírito empresarial, mas também de ideias, instituições e processos abrangendo desde boas universidades para inovar organizações financeiras, que nem sempre aparecem espontaneamente pela operação de mercados livres. Algumas vezes, precisam ser projetadas pela ação pública. Grandes negócios e a nata rica florescem em sociedades fortes que equipam seus empresários para prosperar. A estrutura que suporta isso custa dinheiro, e os ricos devem contribuir proporcionalmente.

Protestos em Londres: enquanto os ricos pedem mimos, cidadãos
foram presos até por mensagens do Facebook. Foto: Leon Neal/AFP

Mas isso significa um “Big Government”, reclamam os americanos neoconservadores, para que essas propostas corriqueiras, de senso comum, se transformem em uma suposta diminuição da liberdade individual – culminando no movimento do Tea Party e na desordem da política dos EUA. Abençoada é uma sociedade fraca e um Estado estrangulado com numerosos  indivíduos ricos com taxas baixas. Exceto que no espaço de uma geração todos estarão mais pobres.
Na última semana, o Reino Unido teve seu próprio mini-momento Tea Party – uma carta extraordinária assinada por cerca de 20 economistas reivindicava excluir a política do debate sobre a taxa máxima de imposto de renda. O Reino Unido precisava de uma estratégia de crescimento, argumentaram, e o que estava retendo o investimento direto interno, a assunção de riscos e o zelo empresarial em geral era o aumento na taxa máxima de impostos para 50 centavos por uma libra, para aqueles que ganham mais de 150 mil libras por ano (cerca de 405 mil reais), um aumento que o governo de coalizão não havia revertido – mas deveria, argumentaram.
Isso foi um exagero, um engodo político. Obviamente, taxas de impostos punitivas e confiscatórias são um impedimento para o empreendimento, mas uma taxa máxima de imposto de 50% dificilmente se qualifica para tanto. Em vez disso, os analistas abraçam a noção de uma racionalidade econômica para poder identificar previsíveis e mensuráveis aumentos no esforço e zelo empresarial para cortes comparáveis em imposto de renda em uma relação linear.
Mas a motivação humana, especialmente para construtores de negócios e empresários, é infinitamente mais sutil. Eles são movidos por uma matriz de motivações. E, como todos, estão incorporados na família e amizades, enraizadas no local. Os poucos bons estudos que temos mostram, por exemplo, que diferenças significantes na taxa máxima de imposto de renda não fazem as pessoas migrarem pelos EUA – uma tarefa mais fácil que entrar ou sair do Reino Unido. Nem são as diferenças comparadas por um desempenho diferencial significativo de crescimento.
Igualmente, a afirmação de que os maiores pagadores de impostos contribuem com tanta receita que devem ser impedidos de se tornarem uma espécie em extinção é misturar maçãs e peras. O que tem levado aos aumentos em rendimentos do 1% dos maiores contribuintes é o monumental crescimento da desigualdade de renda nos últimos 25 anos – algo que não foi associado com desempenho econômico melhor.
Em vez disso, tem havido uma corrida armamentícia levando a um pagamento executivo cada vez maior, certamente trazendo certo viés de alta às taxas de rendimentos, mas deve ser dificilmente confundido como “incentivo” de taxas menores para os ricos. Mas os signatários foram descuidados a respeito dessa evidência– e de muitas outras evidências. Por exemplo, a afirmação deles de que outras grandes economias “voltaram para níveis de rendimentos pré-recessão”, enquanto o Reino Unido, tirando dinheiro dos ricos, não tinha alcançado o mesmo estágio, está errado. Todos os seis países ricos – EUA, Alemanha, Japão, França, Itália e Reino Unido – declararam rendimentos no segundo trimestre de 2011 abaixo dos respectivos ápices de 2008. Nenhum deles se recuperou completamente. Os EUA e a Alemanha se saíram menos mal – mas suas taxas máximas de imposto variam consideravelmente.  Uma correlação linear entre taxar os ricos e o crescimento não existe.
A carta, por todas as suas pretensões por “não ser sobre política econômica”, foi ao invés disso uma rendição à visão de mundo do Tea Party. A Pfizer não fechou recentemente sua operação em Sandwich, Kent, por causa da taxa de imposto de renda de 50%: em vez disso, massivamente preocupada com seu modelo de negócios, concentrou pesquisa nas partes do mundo onde julga que há uma forte ecologia apoiando a indústria farmacêutica. Igualmente, Telefônica, que instalou seus negócios digitais em Londres na última semana, veio para o Reino Unido atraída pela abertura e pelo ecossistema a apoiar sua operação digital. A taxa máxima de imposto não intimidou sua decisão.
Então por que 20 economistas arriscaram assim suas reputações? Parte da resposta é que os próprios economistas foram tão aprisionados pela direita neoconservadora que muitos de seus praticantes não conseguem mais pensar direito. E por qualquer variedade de razões pessoais ou políticas, há virilidade em se associar com o primitivo, uma visão do capitalismo caçador-colecionador. Para fazer melhor, para desafiar as atuais ortodoxias, requer originalidade e trabalho duro. É muito mais fácil assinar uma carta abaixo do padrão para o FT.
Não se discute que os ricos gostam de pagar impostos. Eles não gostam. Mas um número crescente, como o ex-chefe do M&S Stuart Rose, recomendam ao governo a não prestar atenção nos economistas. Eles reconhecem que os ricos também são parte da sociedade. Talvez a pior consequências da carta é que esta desvia a discussão do que realmente move o capitalismo dinâmico – o impulso revolucionário para inovar e o profunda investimento em suas instituições, o que auxilia ou encoraja esse esforço. Onde isso não está ocorrendo, precisa ser corrigido por um Estado empreendedor – um argumento que eu e dois colegas estabelecemos em um artigo “Fazendo do Reino Unido um Eixo de Inovação” para o recém formado Big Innovation Centre no site http://www.biginnovationcentre/.
A taxa máxima de imposto não poder estar sozinha no coração de uma estratégia de crescimento. O Reino Unido precisa de mais demanda, bancos mais fortes, um capitalismo melhor e estrutura institucional mais sólida para ajudar a capitalizar em cima de futuras ondas de possibilidades tecnológicas e científicas. Arrume tudo isso e o crescimento e o investimento seguirão. A geração de riqueza é muito mais do que mimar os ricos.
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