Hoje pela manhã, estava comentando via twitter a respeito da criação de um imposto sobre grandes áreas de terra. No Uruguai, que fique claro. O Presidente Pepe Mujica implementou uma tributação singela ao latifúndio hermano, estão chamando de “Impuesto del agro” Se dará da seguinte forma: A propriedade que tiver mais de 2 mil hectares, o proprietário pagará 8 dólares por hectare; a partir de 5mil hectares pagará 12 dólares; e por áreas superiores a 10 mil hectares 16 dólares. Acreditem que mesmo a contribuição sendo modesta, foi suficiente pra mobilizar os setores da direita, agro-exportadores e conseguiu inclusive a contrariedade do Vice Presidente Danilo Astori.
Na condição de meio sangue, filho de mãe uruguaia e de ter vivido grande parte de minha vida no Uruguai, quero fazer algumas considerações, acerca do imposto e sobre aspectos da região norte do Uruguai.
Astori, Vice Presidente chegou a cair na cantilena ruralista de que este imposto ou a quebra de regras no campo inibiria “las inversiones”.
Interessante, pois este “impostinho” vai atingir uma grande parte dos latifundiários brasileiros que lá criam gado e plantam arroz. Muitos inclusive são devedores do Banco do Brasil. Cruzaram a fronteira com suas máquinas e implementos, deram o calote aqui e lá são “grandes produtores”.
Pra quem não conhece a fronteira, povoados como Vichadero, Caraguatá, Pueblo Ancina, Hospital, enfim regiões dos Departamentos de Rivera, Tacuarembó e até fronteiras de Durazno, Flores e Florida, grande parte das propriedades rurais estão nas mãos de brasileiros, alguns são beneficiários de deságios em contribuições rurais e outros incntivos.
Ainda estão vivas nas minhas lembranças as pescarias no Rio Negro, Jaguari, Tacuarembó e Caraguatá, épocas de grandes bocudas (traíras de 6,7 kg), dourados e Jundiás, as Mojarras saltavam na beira d'água. Ficaram as lembranças e os contos. Os arrozeiros brasileiros que se instalaram nestas várzeas acabaram com a vida destes rios.
Saúdo vigorosamente este Tupamaro de grande estampa que é Pepe Mujica. Sua coragem e sua coerência, não apenas nesta luta que é sua, mas, também de todos seus companheiros da Frente Amplia.
Mujica faz no Uruguai o que deve ser feito aqui, prioritariamente no RS e mais especificamente na campanha e Fronteira Oeste deste torrão guasca e tartufo.
Apenas pra ilustrar, nestas regiões existem estâncias que suas extensões são maiores que muitos municípios da região metropolitana de Porto Alegre e de cidades do noroeste e norte do Estado.
Evidente que esta gente urbana e metropolitana não faz a menor idéia do que sejam 2 ou 5 mil hectares de campo. Pessoas que conhecem vaquinhas e ovelhinhas na Expointer. E acham tão meigas.
Sou crioulo de uma cidade (Livramento) que tem 7, 1 mil Km² de extensão, dona do maior rebanho bovino do estado, o 2º maior rebanho ovino, mais de 4 mil km de estradas vicinais. E sabem com o que
isto contribui pra qualidade de vida de seus habitantes? Com nada. Absolutamente nada. O agronegócio neste e noutros municípios fronteiriços representam em média 10% do PIB.
A contradição com esta suposta “riqueza” é tamanha que os PIBs destas cidades são formados praticamente por comércio, serviços e repasses do governo federal.
Hoje pela manhã, falei tanto sobre este imposto sobre o latifúndio no twitter (me sigam @gilmardarosa), que cheguei a sugerir para os parlamentares de vários partidos que me acompanham nas redes sociais, que adotassem o novo imposto por aqui.
A proposta é começar a taxação em propriedades com mais de 1 mil hectares, esta pagaria uma taxa de R$ 20 pilas por hectare; a partir de 2 mil hectares R$50 p/hectare; acima de 5mil hectares pagaria R$100 pilas por hectare. Esta taxa poderia estar contemplado no ITR e como tal, ficar nos cofres dos municípios.
Pra começar a negociar a lei do latifúndio, se proporia que áreas de preservação, matas nativas, encostas e matas ciliares não estariam sujeitas a esta tributação.
Hoje quando relatava isso na rede, muitos me chamaram de anarquista, terrorista ou que estava em devaneios. Que não poderia igualar um país com o gigantismo do Brasil com países como Uruguai e Argentina, que lá as “coisas” são mais fáceis de resolver.
Discordei de todos e elenquei algumas questões que os tornam diferentes e por isso fazem possíveis estas legislações:
- Lá é possível poque levaram a sério o esclarecimento da ditadura e dos ditadores, efetivaram seus julgamentos e punições.
- Lá é possível pois o sistema eleitoral é baseado no voto em lista.
- Lá é possível pois todos os temas relevantes para a sociedade, são levados a plebiscito numa clara demonstração de aprofundamento da democracia direta e participativa.
- Lá é possível poque o General que ofendeu o presidente foi preso. Melhor, os 8 que desobedeceram também foram presos. Aqui temos bancada do coturno.
- Lá a atividade parlamentar é controlada por eleitores e partidos. Sua atuação é condição Sine Qua Nom pra permanecer na lista.
Enfim, gostaria de ver este tipo de discussão no seio do parlamento bradileiro e gaúcho, sem revanchismo, mas, pautado nas demandas sociais e corrigindo injustiças cruéis que saltam aos olhos de qualquer observador mediano. Será que falta qualificação e empenho aos nosso parlamentares? Será que falta capacidade crítica aos eleitores e apoiadores destes parlamentares? O que realmente difere a atuação e produção legislativa dos nossos com os demais parlamentares do Mercosul e Latino América? Porque nossos parlamentares são pautados por uma mídia extremamente conservadora, que é monopólio de meia duzia de famílias e estes aceitam?
São indagações, simples e reais. As respostas estão em todos e cada um dos interesses que compões este tabuleiro da vida política e partid´´aria brasileira.
Nossos parlamentares são em sua maioria eleitos com dinheiro de grandes empresas, grandes fazendeiros, e isto quando não o são eles próprios os parlamentares. Nosso eleitorado não consegue estabelecer o elo que há entre latifúndio e injustiças sociais. Ainda tem o discurso do "direito à propriedade acima de tudo". Vejo-o através de meus alunos, que refletem o pensamento de seus pais, ainda mais numa sociedade conservadora como a de Lages (SC) que é onde moro. Aqui os mais ricos possuem terras e nelas criam cavalos ou plantam pinus para a indústria de papel. Aí se explica porque a "região serrana" catarinense é a mais pobre do estado.
ResponderExcluirMuitos afirmam que a "alternância" no poder é fundamental mas temo que se um dia retornarem governantes de direita conquistas como o citado "impuesto del agro" seja em seguida revogado. Não sei se no Brasil seria diferente, infelizmente.